Texto escrito e dedicado a uma amiga, que além de grande, deve ser a melhor.
Bahia, dezembro de 2010
Você me perguntou o porquê de eu estar “meio assim”: taciturno, distante... Me perguntou se eu não queria fazer 22, depois de dizer que eu estava com a cara de cansado. Eu te respondi (talvez até por falta do que dizer e também por querer reafirmar minha postura “anti-aniversarialista” ridícula), que eu estava “morrendo” por fazer aniversário na próxima semana e por isso estava com “ares” e olhares reflexivos e distantes.
Esqueça o que eu disse!!!
Enquanto lia o meu mais recente livro de cabeceira (o “Pequeno tratado das grandes virtudes”), me deparei com um capítulo que me fez rever tudo o que eu tinha te declarado horas antes, naquela mesma noite – na madrugada seguinte à nossa conversa, para ser mais exato. Tal capítulo tinha como título “A gratidão”. Isso mesmo, a gratidão: de maneira coincidente a necessidade que eu tinha por ler algo a seu respeito, ao passo que de maneira paradoxal à minha postura, instantes atrás, que denotava total ingratidão, por enxergar a data natalina apenas como um simples “pressagio” para o fim de todo o homem (você até concordou: “todo mundo tá morrendo” (não que você seja ingrata, necessariamente)).
O capítulo tratava da gratidão em sua abordagem mais profunda e “definitiva”: Gratidão por estar vivendo e por ter vivido. Gratidão pela possibilidade de continuar vivendo. Sem apego ao futuro e do mesmo modo, sem nostalgia. Só o “daqui”, sem que haja muito “pra frente”. Gratidão pelo que me é externo, haja vista que “Ninguém é causa de si, nem portanto (em última instância) de sua alegria”. Grato pelo momento, por poder compartilhar isso com você. Sem que haja algum tipo de pesar ou de reflexão em demasia.
Pra terminar, um trecho do capítulo que expressa com muito mais propriedade o que eu quis te dizer nessas linhas:
“(...) o sábio regozija-se com viver, claro, mas também com ter vivido. A gratidão (charis) é essa alegria da memória, esse amor do passado – não o sofrimento do que não é mais, nem o pesar pelo que não foi, mas a lembrança alegre do que foi. É o tempo reencontrado, se quisermos (“ a gratidão do que foi”, diz Epicuro). Compreendemos que esse tempo torna a idéia da morte indiferente, como dirá Proust, pois aquilo que vivemos, a própria morte, que nos levará, não poderia tomar de nós: são bens imortais, diz Epicuro, não porque não morremos, mas porque a morte não poderia anular o que vivemos, o que fugidia e definitivamente vivemos. A morte só nos privará do futuro, que não é. A gratidão liberta-nos dele, pelo saber alegre do que foi. O reconhecimento é um conhecimento (ao passo que a esperança nada mais é que uma imaginação); é por aí que ela alcança a verdade, que é eterna, e a habita. Gratidão: desfrutar eternidade”.
André Comte-Sponville
Enfim, grato pela atenção.
Beijo.
quarta-feira, 15 de dezembro de 2010
sábado, 11 de dezembro de 2010
Sobre ficção, religião e ciência oficial (texto embrionário)
“Existem mais coisas entre os céus e a Terra... do que sonha sua vã filosofia”.
Nos séculos XIX e XX, tempos de grande conflito entre o conhecimento essencialmente cientifico e as explicações de mundo produzidas pelos “leigos”, surge um conceito que longe de tentar mediar os embates estabelecidos em torno do fundamentalismo, tanto da ciência quanto da “ignorância”, serviu como “pano pra manga” para as mais bizarras especulações dos caminhos para os quais os avanços científicos e tecnológicos levariam a humanidade. Mas o que suscitaria a esperança de encontrar características de agente mediador em um conceito tão gasto e na moda, sobretudo no cinema e na TV? A esperança – ainda que seja ela “esperança” na falta de termo que melhor indique o interesse num eventual “meio termo” entre crenças e a ciência oficial – consiste no surgimento do conceito como parte da fórmula ficção + ciência.
Muito embora já houvesse registros de elementos de ficção cientifica em obras de autores do século XVIII, talvez pela produção de histórias fantásticas mais elaboradas que traziam em si maior encadeamento “pseudológico”, foi Júlio Verne (século XIX), notadamente, seu principal precursor na qualidade de gênero literário. O assustador desenvolvimento científico e tecnológico levando o homem a formas, feitos e mundos inimagináveis: esse é o enredo que observamos nessas obras, tanto na literatura clássica do gênero, quanto nos mais recentes sucessos de bilheteria nos século XX e XXI. Mas até que ponto a ciência é o real e que lhe sobra ou falta, ficção?
Por muitas vezes a ciência é temida por aqueles que esquecem que ela é fruto – talvez o mais excelente – do progresso da mente humana. Por muitas vezes a ciência é tratada como algo transcendente à espécie humana, vide o grande aumento da produção intelectual, que resulta em um processo de especialização cada vez maior e culmina na produção duma gama de conhecimentos profundos sobre determinadas áreas. Dessa forma, o homem comum se vê como dominado pela grande ciência. Se enxerga como refém de algo de que ele é tão profundamente dependente, quanto ignorante.
Desde muito tempo, quem não estava presente em dado momento ou não consegue enxergar algo, tenta explicar o que aconteceu durante sua ausência ou explicar como as coisas não vistas influenciam e transformam as vistas. Como exemplo podemos citar os estudos paleontológicos, que investigam o tempo profundo através de evidencias geológicas deixadas pelas inúmeras transformações ocorridas na estrutura terrestre, bem como os estudos geológicos e geofísicos da composição do interior da Terra, possíveis a partir da observação da propagação das ondas sísmicas e de seu comportamento em relação aos diferentes ambientes pelos quais passam, desde seu hipocentro até seu epicentro. Tais estudos só se fizeram necessários devido ao fato de que nenhum homem esteve presente a 4,5 bilhões de anos atrás, e provavelmente, jamais chegará ao núcleo da Terra ele mesmo.
São nos momentos de relativa impotência científica que surge a ficção, propondo viagens no tempo e ao centro da Terra através de máquinas mirabolantes e mundos fantásticos. Do mesmo modo, são nos momentos de “momento zero” (exato momento antes do Big Bang), que surge o princípio no qual “criou Deus o céus e a Terra”, sem que haja evidências claras nem de um nem de outro. Por fim, surge um terceiro e derradeiro momento: o momento no qual tanto o crente quanto o cientista exercem a fé. A nossa fantástica fábrica de incertezas: a hipótese.
Continua a partir dos credos e crenças (Deus sabe quando)...
Nos séculos XIX e XX, tempos de grande conflito entre o conhecimento essencialmente cientifico e as explicações de mundo produzidas pelos “leigos”, surge um conceito que longe de tentar mediar os embates estabelecidos em torno do fundamentalismo, tanto da ciência quanto da “ignorância”, serviu como “pano pra manga” para as mais bizarras especulações dos caminhos para os quais os avanços científicos e tecnológicos levariam a humanidade. Mas o que suscitaria a esperança de encontrar características de agente mediador em um conceito tão gasto e na moda, sobretudo no cinema e na TV? A esperança – ainda que seja ela “esperança” na falta de termo que melhor indique o interesse num eventual “meio termo” entre crenças e a ciência oficial – consiste no surgimento do conceito como parte da fórmula ficção + ciência.
Muito embora já houvesse registros de elementos de ficção cientifica em obras de autores do século XVIII, talvez pela produção de histórias fantásticas mais elaboradas que traziam em si maior encadeamento “pseudológico”, foi Júlio Verne (século XIX), notadamente, seu principal precursor na qualidade de gênero literário. O assustador desenvolvimento científico e tecnológico levando o homem a formas, feitos e mundos inimagináveis: esse é o enredo que observamos nessas obras, tanto na literatura clássica do gênero, quanto nos mais recentes sucessos de bilheteria nos século XX e XXI. Mas até que ponto a ciência é o real e que lhe sobra ou falta, ficção?
Por muitas vezes a ciência é temida por aqueles que esquecem que ela é fruto – talvez o mais excelente – do progresso da mente humana. Por muitas vezes a ciência é tratada como algo transcendente à espécie humana, vide o grande aumento da produção intelectual, que resulta em um processo de especialização cada vez maior e culmina na produção duma gama de conhecimentos profundos sobre determinadas áreas. Dessa forma, o homem comum se vê como dominado pela grande ciência. Se enxerga como refém de algo de que ele é tão profundamente dependente, quanto ignorante.
Desde muito tempo, quem não estava presente em dado momento ou não consegue enxergar algo, tenta explicar o que aconteceu durante sua ausência ou explicar como as coisas não vistas influenciam e transformam as vistas. Como exemplo podemos citar os estudos paleontológicos, que investigam o tempo profundo através de evidencias geológicas deixadas pelas inúmeras transformações ocorridas na estrutura terrestre, bem como os estudos geológicos e geofísicos da composição do interior da Terra, possíveis a partir da observação da propagação das ondas sísmicas e de seu comportamento em relação aos diferentes ambientes pelos quais passam, desde seu hipocentro até seu epicentro. Tais estudos só se fizeram necessários devido ao fato de que nenhum homem esteve presente a 4,5 bilhões de anos atrás, e provavelmente, jamais chegará ao núcleo da Terra ele mesmo.
São nos momentos de relativa impotência científica que surge a ficção, propondo viagens no tempo e ao centro da Terra através de máquinas mirabolantes e mundos fantásticos. Do mesmo modo, são nos momentos de “momento zero” (exato momento antes do Big Bang), que surge o princípio no qual “criou Deus o céus e a Terra”, sem que haja evidências claras nem de um nem de outro. Por fim, surge um terceiro e derradeiro momento: o momento no qual tanto o crente quanto o cientista exercem a fé. A nossa fantástica fábrica de incertezas: a hipótese.
Continua a partir dos credos e crenças (Deus sabe quando)...
Assinar:
Postagens (Atom)